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O Amor à Primeira, Segunda e Eterna Vista: Uma Despedida da Bósnia


DE BRČKO — Há partidas que são apenas interrupções. Chego ao fim destes seis meses de mobilidade na Universidade de Sarajevo com a certeza de que a Bósnia não é um lugar a que se vai, mas um lugar que se regressa, sempre. Mesmo tendo já estado aqui outras vezes, desta vez foi diferente. Desta vez, foi para ficar. No coração, claro, porque é aí que a Herzegovina, a Republika Srpska e a Federação se unem sem fronteiras, num país só feito de gente boa.

Como agradecer a um povo que transforma um estrangeiro em quase família? Começo pelos corredores do Departamento de Ciências Políticas da Universidade, onde a professora Sanela não foi apenas uma orientadora, mas uma verdadeira anfitriã. À sua equipe, aos docentes que partilharam não apenas conhecimento, mas histórias de vida, o meu profundo hvala. Aprendi mais nos vossos gabinetes e cafés do que em qualquer livro, principalmente quando iam me visitar em minha sala. 

À Organização Internacional CARE, Sumka e Branislav, pelo trabalho inspirador e pela oportunidade de ver de perto a resiliência bósnia transformada em ação nas cooperativas. A Maya, que tarde da noite me recebeu em Bratunac e me integrou na cooperativa Zena durante minhas visitas. Não posso deixar de agradecer ao querido guia Enes, que, sozinho, me levou por estradas escondidas e memórias dolorosas, mostrando que a maior gentileza é não ter pressa.

As minhas viagens levaram-me de Banja Luka a Bratunac, de Bjieljina a Rapovac e Dongi Agici, Mostar, dentre muitos outros recantos. Em cada cooperativa, em cada sala de reuniões, fui recebido não como um visitante, mas como um convidado. Aos diretores, aos membros, às mulheres e homens que me contaram as suas lutas e colheitas, o meu respeito. O café sempre quente, a rakija sempre pronto, e a pausa sempre longa o suficiente para que uma conversa de negócios se transformasse numa conversa de vida.

E como não falar de Nevena, em Bjelina, Banja Luka e Dongi Agici, cuja voz e tradução foram muito mais que ponte linguística: foram ponte humana. Ou do gentil amigo da agência de aluguer de carros, que me tratou como um amigo de longa data, preocupando-se com as estradas que eu percorreria e com o meu regresso a casa.

Há uma magia peculiar neste país. Uma mistura de dor e alegria, de história pesada e leveza no trato, que me fez sentir, curiosamente, em casa, principalmente na casa de D Leila, em Sarajevo. E talvez as semelhanças com Brasília não sejam apenas arquitetônicas — ambas são capitais de sonhos e lutas, de modernidade e tradição —, mas sobretudo humanas: a mesma largueza de sorrisos, a mesma generosidade sem pressa.

Foi a terceira vez que aqui estive, e prometo que não será a última. Porque a Bósnia conquista-nos não só pelo cevapi e pelo café, pela história e pelas paisagens, mas pelo olhar que não se perde, pela palavra certa mesmo em silêncio, pela simplicidade que é a forma mais complexa de elegância.

Levo comigo o cheiro das montanhas, o sabor do somun acabado de sair do forno, o eco dos chamamentos à oração misturados com os sinos das igrejas. Levo, acima de tudo, a certeza de que pertenço a este lugar tanto quanto ele me pertence.

Za sve vas, moji prijatelji, jedna jednostavna rečenica iz dubine srca:

“Hvala vam što ste mi otvorili svoje domove i svoja srca. Bosnia i Hercegovina, uvijek ću te nositi sa sobom.”

(Para todos vocês, meus amigos, uma simples frase da profundidade do coração:

“Obrigado por terem aberto a vossa casa e o vosso coração. Bósnia e Herzegovina, levo-vos sempre comigo.”)

Com eterna gratidão,

Um bósnio de coração.


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